NotíciasNotícias TributáriasLIMINARES APLICAM MODULAÇÃO DA “TESE DO SÉCULO” A CASOS TRANSITADOS EM JULGADO

04/08/2021

Devido à modulação dos efeitos da chamada “tese do século”, a União conseguiu duas liminares favoráveis à suspensão de decisões que garantiam o direito de empresas receberem de volta os valores pagos a mais com a inclusão do ICMS na base de cálculo do PIS e da Cofins.

O Supremo Tribunal Federal definiu, em 2017, que o ICMS deve ser excluído do cálculo dessas contribuições. Em maio deste ano, a corte modulou os efeitos da decisão, ou seja, determinou que ela só tem efeitos a partir da data do primeiro julgamento. Assim, a inclusão do ICMS seria indevida apenas a partir do dia 15 de março de 2017.

Porém, o STF não deixou claro o que deveria acontecer com ações movidas depois de março de 2017 e que já transitaram em julgado. Recentemente, uma liminar do Tribunal Regional Federal da 5ª Região afastou a modulação a um caso do tipo e determinou a devolução de todos os valores pagos a mais durante os cinco anos anteriores ao ajuizamento da ação, correspondentes ao prazo da prescrição tributária.

Mas, no último mês de julho, desembargadores do TRF-4 e do TRF-5 tiveram o entendimento oposto e decidiram limitar essa devolução apenas aos tributos pagos a partir de março de 2017.

TRF-4

Uma empresa de comércio e distribuição de metais havia movido uma ação em setembro de 2017 para recuperar os valores. O TRF-4 reconheceu o direito à restituição, e a decisão transitou em julgado em abril de 2019.

Após a modulação da “tese do século”, a Procuradoria-Geral da Fazenda Nacional acionou a Justiça para rescindir o acórdão e limitar a exclusão do ICMS aos fatos geradores ocorridos a partir de março de 2017.

A desembargadora Luciane Amaral Corrêa Münch considerou que, no acórdão, o tribunal efetuou “exame de questão recursal que já havia sido entregue à Suprema Corte“, e assim acabou contrariando os parâmetros temporais estabelecidos mais tarde.

“Eventual compensação dos valores no âmbito administrativo, pode, efetivamente, culminar no enriquecimento ilícito da parte exequente e na eventual impossibilidade de ressarcimento ao erário, em caso de procedência da presente ação”, ressaltou a magistrada. Assim, ela barrou a tramitação administrativa da compensação dos valores.

TRF-5

No outro caso, uma companhia sergipana de eletricidade moveu ação em 28 de março de 2017 — poucas semanas após a decisão de mérito do STF. A 1ª Turma do TRF-5 reconheceu o direito de compensação das parcelas pagas antes daquele mês. A decisão transitou em julgado em julho de 2019. A União, então, ajuizou ação rescisória.

Embora o posicionamento adotado pelo julgado rescindendo estivesse em harmonia com o entendimento firmado pelo Plenário do Supremo, à época da sua formalização, entendo que a modulação ulterior dos efeitos de um paradigma de observância obrigatória encerra hipótese de rescisão, por afronta manifesta de norma jurídica“, apontou o desembargador Élio Wanderley de Siqueira Filho.

Devido ao desacordo com a modulação e à “dificuldade de eventual recuperação do crédito tributário“, o magistrado suspendeu os efeitos da decisão e interrompeu a tramitação dos pedidos de restituição, até o julgamento do mérito da ação.

Coisa Julgada

A advogada Amal Nasrallah, sócia da Nasrallah Advocacia, ressaltou que “sempre que o STF é instado a decidir sobre questões que envolvem coisa julgada, mesmo que a coisa julgada contrarie suas próprias decisões, tem decidido no sentido que prevalece a coisa julgada”.

Acrescenta que “a coisa julgada é um princípio orientador do Estado Democrático de Direito e está prevista no artigo 5º da Constituição Federal, em seu inciso XXXVI, que dispõe: “A lei não prejudicará o direito adquirido, o ato jurídico perfeito e a coisa julgada”.

O objetivo do instituto da coisa julgada, é conferir segurança jurídica. É por essa razão que o Supremo Tribunal Federal, por mais de uma vez, quando chamado a tratar do tema sempre opta em privilegiar a segurança jurídica e a consequente, decisão transitada em julgado.

De fato, a jurisprudência da Corte Suprema, tem sido no sentido de que a coisa julgada, como proteção máxima da segurança jurídica e da certeza do direito, como instrumento de estabilidade da ordem jurídica, não pode ser modificada, mesmo que o Supremo venha a consolidar seu entendimento em sentido contrário à decisão transitada em julgado. O STJ tem aplicado o mesmo entendimento.

Veja ainda, que para desconstituição de coisa julgada é necessário o ajuizamento de ação rescisória. Nesse ponto cumpre lembrar que o STF já firmou a compreensão de que não cabe ação rescisória quando o julgado estiver em harmonia com o entendimento firmado pelo Plenário do Supremo à época da formalização do acórdão rescindendo, ainda que ocorra posterior superação do precedente (Tema 136/STF).

A advogada indicou precedentes do STF em que entendeu pela manutenção da decisão, em respeito ao princípio da coisa julgada:

“RECURSO EXTRAORDINÁRIO – COISA JULGADA EM SENTIDO MATERIAL – INDISCUTIBILIDADE, IMUTABILIDADE E COERCIBILIDADE: ATRIBUTOS ESPECIAIS QUE QUALIFICAM OS EFEITOS RESULTANTES DO COMANDO SENTENCIAL – PROTEÇÃO CONSTITUCIONAL QUE AMPARA E PRESERVA A AUTORIDADE DA COISA JULGADA – EXIGÊNCIA DE CERTEZA E DE SEGURANÇA JURÍDICAS – VALORES FUNDAMENTAIS INERENTES AO ESTADO DEMOCRÁTICO DE DIREITO – EFICÁCIA PRECLUSIVA DA “RES JUDICATA” – “TANTUM JUDICATUM QUANTUM DISPUTATUM VEL DISPUTARI DEBEBAT” – CONSEQUENTE IMPOSSIBILIDADE DE REDISCUSSÃO DE CONTROVÉRSIA JÁ APRECIADA EM DECISÃO TRANSITADA EM JULGADO, AINDA QUE PROFERIDA EM CONFRONTO COM A JURISPRUDÊNCIA PREDOMINANTE NO SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL – SUCUMBÊNCIA RECURSAL – (CPC, ART. 85, § 11) – NÃO DECRETAÇÃO, NO CASO, ANTE A AUSÊNCIA DE CONDENAÇÃO EM VERBA HONORÁRIA NA ORIGEM EM FAVOR DA PARTE ORA RECORRIDA – AGRAVO INTERNO IMPROVIDO”. (RE 1126631 AgR, Relator(a): CELSO DE MELLO, Segunda Turma, julgado em 31/05/2019, PROCESSO ELETRÔNICO DJe-139 DIVULG 26-06-2019 PUBLIC 27-06-2019)

“RECURSO EXTRAORDINÁRIO – COISA JULGADA EM SENTIDO MATERIAL – INDISCUTIBILIDADE, IMUTABILIDADE E COERCIBILIDADE: ATRIBUTOS ESPECIAIS QUE QUALIFICAM OS EFEITOS RESULTANTES DO COMANDO SENTENCIAL – PROTEÇÃO CONSTITUCIONAL QUE AMPARA E PRESERVA A AUTORIDADE DA COISA JULGADA – EXIGÊNCIA DE CERTEZA E DE SEGURANÇA JURÍDICAS – VALORES FUNDAMENTAIS INERENTES AO ESTADO DEMOCRÁTICO DE DIREITO – EFICÁCIA PRECLUSIVA DA “RES JUDICATA” – “TANTUM JUDICATUM QUANTUM DISPUTATUM VEL DISPUTARI DEBEBAT” – CONSEQUENTE IMPOSSIBILIDADE DE REDISCUSSÃO DE CONTROVÉRSIA JÁ APRECIADA EM DECISÃO TRANSITADA EM JULGADO, AINDA QUE PROFERIDA EM CONFRONTO COM A JURISPRUDÊNCIA PREDOMINANTE NO SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL – A QUESTÃO DO ALCANCE DO PARÁGRAFO ÚNICO DO ART. 741 DO CPC – MAGISTÉRIO DA DOUTRINA – RECURSO DE AGRAVO IMPROVIDO. – A sentença de mérito transitada em julgado só pode ser desconstituída mediante ajuizamento de específica ação autônoma de impugnação (ação rescisória) que haja sido proposta na fluência do prazo decadencial previsto em lei, pois, com o exaurimento de referido lapso temporal, estar-se-á diante da coisa soberanamente julgada, insuscetível de ulterior modificação, ainda que o ato sentencial encontre fundamento em legislação que, em momento posterior, tenha sido declarada inconstitucional pelo Supremo Tribunal Federal, quer em sede de controle abstrato, quer no âmbito de fiscalização incidental de constitucionalidade. – A superveniência de decisão do Supremo Tribunal Federal, declaratória de inconstitucionalidade de diploma normativo utilizado como fundamento do título judicial questionado, ainda que impregnada de eficácia “ex tunc” – como sucede, ordinariamente, com os julgamentos proferidos em sede de fiscalização concentrada (RTJ 87/758 – RTJ 164/506-509 – RTJ 201/765) -, não se revela apta, só por si, a desconstituir a autoridade da coisa julgada, que traduz, em nosso sistema jurídico, limite insuperável à força retroativa resultante dos pronunciamentos que emanam, “in abstracto”, da Suprema Corte. Doutrina. Precedentes. – O significado do instituto da coisa julgada material como expressão da própria supremacia do ordenamento constitucional e como elemento inerente à existência do Estado Democrático de Direito”. (RE 592912 AgR, Relator(a): CELSO DE MELLO, Segunda Turma, julgado em 03/04/2012, ACÓRDÃO ELETRÔNICO DJe-229 DIVULG 21-11-2012 PUBLIC 22-11-2012 RTJ VOL-00226-01 PP-00633)

“CONSTITUCIONAL. LEGITIMIDADE DAS NORMAS ESTABELECENDO PRAZO DE TRINTA DIAS PARA EMBARGOS À EXECUÇÃO CONTRA A FAZENDA PÚBLICA (ART. 1º-B DA LEI 9.494/97) E PRAZO PRESCRICIONAL DE CINCO ANOS PARA AÇÕES DE INDENIZAÇÃO CONTRA PESSOAS DE DIREITO PÚBLICO E PRESTADORAS DE SERVIÇOS PÚBLICOS (ART. 1º-C DA LEI 9.494/97). LEGITIMIDADE DA NORMA PROCESSUAL QUE INSTITUI HIPÓTESE DE INEXIGIBILIDADE DE TÍTULO EXECUTIVO JUDICIAL EIVADO DE INCONSTITUCIONALIDADE QUALIFICADA (ART. 741, PARÁGRAFO ÚNICO E ART. 475-L, § 1º DO CPC/73; ART. 525, § 1º, III E §§ 12 E 14 E ART. 535, III, § 5º DO CPC/15). 1. É constitucional a norma decorrente do art. 1º-B da Lei 9.494/97, que fixa em trinta dias o prazo para a propositura de embargos à execução de título judicial contra a Fazenda Pública. 2. É constitucional a norma decorrente do art. 1º-C da Lei 9.494/97, que fixa em cinco anos o prazo prescricional para as ações de indenização por danos causados por agentes de pessoas jurídicas de direito público e de pessoas jurídicas de direito privado prestadoras de serviços públicos, reproduzindo a regra já estabelecida, para a União, os Estados e os Municípios, no art. 1º do Decreto 20.910/32. 3. São constitucionais as disposições normativas do parágrafo único do art. 741 do CPC, do § 1º do art. 475-L, ambos do CPC/73, bem como os correspondentes dispositivos do CPC/15, o art. 525, § 1º, III e §§ 12 e 14, o art. 535, § 5º. São dispositivos que, buscando harmonizar a garantia da coisa julgada com o primado da Constituição, vieram agregar ao sistema processual brasileiro um mecanismo com eficácia rescisória de sentenças revestidas de vício de inconstitucionalidade qualificado, assim caracterizado nas hipóteses em que (a) a sentença exequenda esteja fundada em norma reconhecidamente inconstitucional – seja por aplicar norma inconstitucional, seja por aplicar norma em situação ou com um sentido inconstitucionais; ou (b) a sentença exequenda tenha deixado de aplicar norma reconhecidamente constitucional; e (c) desde que, em qualquer dos casos, o reconhecimento dessa constitucionalidade ou a inconstitucionalidade tenha decorrido de julgamento do STF realizado em data anterior ao trânsito em julgado da sentença exequenda. 4. Ação julgada improcedente. (ADI 2418, Relator(a): TEORI ZAVASCKI, Tribunal Pleno, julgado em 04/05/2016, ACÓRDÃO ELETRÔNICO DJe-243 DIVULG 16-11-2016 PUBLIC 17-11-2016)

EMENTA: RECURSO EXTRAORDINÁRIO. COISA JULGADA INCONSTITUCIONAL. ARTIGO 741, PARÁGRAFO ÚNICO, E ARTIGO 475-L, PARÁGRAFO PRIMEIRO, DO CÓDIGO DE PROCESSO CIVIL DE 1973. ARTIGO 525, PARÁGRAFO PRIMEIRO, INCISO III, PARÁGRAFOS 12 E 14, E ARTIGO 535, PARÁGRAFO 5º, DO CÓDIGO DE PROCESSO CIVIL DE 2015. 1. São constitucionais as disposições normativas do parágrafo único do art. 741 do CPC, do § 1º do art. 475-L, ambos do CPC/73, bem como os correspondentes dispositivos do CPC/15, o art. 525, § 1º, III e §§ 12 e 14, o art. 535, § 5º. 2. Os dispositivos questionados buscam harmonizar a garantia da coisa julgada com o primado da Constituição, agregando ao sistema processual brasileiro, um mecanismo com eficácia rescisória de sentenças revestidas de vício de inconstitucionalidade qualificado. 3. São consideradas decisões com vícios de inconstitucionalidade qualificados: (a) a sentença exequenda fundada em norma reconhecidamente inconstitucional, seja por aplicar norma inconstitucional, seja por aplicar norma em situação ou com sentido inconstitucionais; (b) a sentença exequenda que tenha deixado de aplicar norma reconhecidamente constitucional. 4. Para o reconhecimento do vício de inconstitucionalidade qualificado exige-se que o julgamento do STF, que declara a norma constitucional ou inconstitucional, tenha sido realizado em data anterior ao trânsito em julgado da sentença exequenda. 5. Recurso extraordinário a que se nega provimento.” (RE 611503, Relator(a): TEORI ZAVASCKI, Relator(a) p/ Acórdão: EDSON FACHIN, Tribunal Pleno, julgado em 20/08/2018, ACÓRDÃO ELETRÔNICO REPERCUSSÃO GERAL – MÉRITO DJe-053 DIVULG 18-03-2019 PUBLIC 19-03-2019)

SOBRE NÓS

© 2020 Copyright SB&A – Todos os direitos reservados