É sabido que a LGPD impõe uma série de obrigações relacionadas ao tratamento dos dados pessoais, o que, por consequência, tem demandado das empresas a realização de investimentos com consultorias jurídicas, de segurança da informação, ferramentas e programas de segurança e gestão, qualificação dos profissionais, dentre outros necessários a estabelecer um conjunto de boas práticas e governança aptos a permitir cumprir com as regras dessa nova lei.
A questão agora é: tais investimento, com evidente natureza de despesa, gera direito a crédito de PIS/COFINS?
A pergunta se dá porque, a partir da vigência das Leis nº 10.637/2002 e nº 10.833/2003, as pessoas jurídicas optantes pelo regime de tributação da renda com base no Lucro Real passaram a recolher o PIS e a COFINS sob a sistemática da não cumulatividade, podendo se apropriar de créditos com os gastos na aquisição de insumos e deduzi-los da operação atual, de modo a limitar a tributação à parcela agregada em cada etapa do processo produtivo.
Sem dúvida alguma a adoção das práticas vistas acima é necessária para o tratamento dos dados pessoais de maneira adequada e, consequentemente, para o cumprimento das regras da LGPD. Caso não sejam implementadas, ou se mostrem inadequadas ou insuficientes, as empresas poderão sofrer sanções civis e administrativas, inclusive pela Autoridade Nacional de Proteção de Dados (ANPD).
Segundo matéria divulgada pelo Valor Econômico, em 14 de julho, a rede de lojas TNG obteve na justiça o direito de gerar créditos de PIS e COFINS sobre as despesas com adequação e manutenção de programas para gerenciamento de dados exigidos pela LGPD (Lei Geral de Proteção de Dados). A sentença foi dada pela 4º Vara Federal de Campo Grande (MS).
Este entendimento, em primeira instância, teve como base a decisão do Supremo Tribunal de Justiça (STJ), que, em 2018, por meio de Recurso Especial (REsp 1.221.171) em sede de recurso repetitivo, definiu que para fins de creditamento de PIS e COFINS deve ser considerado insumo tudo aquilo que seja imprescindível para o desenvolvimento da atividade econômica. Quando do julgamento, a Ministra Regina Helena Costa destacou que a essencialidade é:
“o item do qual dependa, intrínseca e fundamentalmente, o produto ou o serviço, constituindo elemento estrutural e inseparável do processo produtivo ou da execução do serviço, ou, quando menos, a sua falta lhes prive de qualidade, quantidade e/ou suficiência”. Definiu relevância como a qualidade “identificável no item cuja finalidade, embora não indispensável à elaboração do próprio produto ou à prestação do serviço, integre o processo de produção, seja pelas singularidades de cada cadeia produtiva.”
No mesmo julgamento, o ministro Mauro Campbell estabeleceu pontos importantes do julgado esclarecendo que dentro do critério da relevância está “a aquisição de todos aqueles bens e serviços pertinentes ao, ou que viabilizam o processo produtivo e a prestação de serviços, que neles possam ser direta ou indiretamente empregados e cuja subtração importa na impossibilidade mesma da prestação do serviço ou da produção, isto é, cuja subtração obsta a atividade da empresa, ou implica em substancial perda de qualidade do produto ou serviço daí resultantes”.
Neste conceito, os bens e serviços adquiridos pelas empresas para o cumprimento de obrigações legais também se tornaram insumos aptos a gerar créditos de PIS/COFINS. O Judiciário e a Receita Federal já reconheceram como insumo os gastos com bens e serviços necessários ao cumprimento de imposições legais, tais como aquisição de Equipamentos de Proteção Individual (EPIs) e despesas com tratamento de efluentes para redução de riscos ambientais.
A tese é que, em razão de a LGPD (Lei nº 13.709/2018) instituir uma série de obrigações e ser um investimento obrigatório – pois a exposição de dados poderá gerar riscos à coletividade, inclusive sobre pena de aplicações de sanções administrativas e responsabilidade civil ao infrator das normas da referida Lei, (previstas para entrar em vigor em agosto de 2022), avalia-se que os investimentos correspondentes com essa adequação lhes daria direito a gerar créditos de PIS e COFINS, já que devem ser enquadrados como insumos.
Desde que entrou em vigor, a Lei Geral de Proteção de Dados (LGPD) vem impondo uma série de requisitos a todas as pessoas naturais ou jurídicas de direto público ou privado, que realizam operações de tratamento de dados. A LGPD define regras detalhadas para o acesso, coleta, uso, tratamento e armazenamento de dados, impactando todos os setores da economia. Isso demanda uma profunda transformação no sistema de proteção de dados para todas as empresas brasileiras, independentemente do seu tamanho ou ramo de atividade; ou de onde esteja localizada a organização ou seu centro de dados.
Aguarda-se agora o entendimento da PGFN (Procuradoria Geral da Fazenda Nacional) se os gastos gerados pela LGPD se enquadram ou não nos critérios de relevância e essencialidade indicados pelo STJ.
Caso a Receita Federal (RFB) mantenha entendimento adotado em outros casos, os investimentos gerados com a adequação à LGPD devem gerar créditos de PIS e COFINS, por se enquadrarem no conceito de insumos devido a sua obrigatoriedade legal.
Decisão
Ao analisar a questão no Mandado de Segurança nº 5003440-04.2021.4.03.6000, o juiz federal, Pedro Pereira dos Santos, da 4ª Vara Federal de Campo Grande, proferiu sentença, decidindo que o teste da subtração deveria ser aplicado ao caso e concedeu a segurança para empresa.
“Desse modo, é o” teste de subtração” que revelará a imprescindibilidade e a importância do bem no processo produtivo, somente havendo falar em caracterização como insumo quando a subtração do bem ou serviço em questão resultar na impossibilidade de realização da atividade empresarial ou, no mínimo, lhe acarretar substancial perda de qualidade.
No caso dos autos, pretende a autora considerar como insumos os gastos necessários ao cumprimento das obrigações relacionadas com a Lei Geral de Proteção de Dados Pessoais – LGPD (Lei nº 13.909, de 14 de agosto de 2018).
Tratando-se de investimentos obrigatórios, inclusive sob pena de aplicação de sanções ao infrator das normas da referida Lei 13.909/218, estimo que os custos correspondentes devem ser enquadrados como insumos, nos termos do procedente acima citado. Com efeito, o tratamento dos dados pessoais não fica a critério do comerciante, devendo então os custos respectivos serem reputados como necessários, imprescindíveis ao alcance dos objetivos comerciais.
Diante do exposto, concedo a segurança para: (1) – determinar que a autoridade coatora considere como insumos as despesas comprovadas pela impetrante com o cumprimento das normas da Lei nº Lei nº 13.909, de 14 de agosto de 2018…”